sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Irmã Dorothy Stang-Uma vida dedicada ao Brasil

ESPECIAL
ENTREVISTA
pela jornalista Tânia Rocha


Um pouco da vida e da luta da irmã Dorothy Stang, que foi assassinada friamente na manhã de sábado,do dia 12 de fevereiro de 2005, em Anapu (PA), é apresentada neste espaço especial em homenagem a essa guerreira. A história desta religiosa norte-americana, brasileira naturalizada, o seu envolvimento com os movimentos sociais brasileiros e a sua luta contra o latifúndio em Anapu/PA , pautaram a conversa. Essa entrevista foi concedida no final de 2004 para o site do senador Sibá Machado (PT/AC).


Irmã Dorothy, qual a sua origem? Como a senhora conheceu o Brasil?


Nasci na cidade de Dayton, Estado de Ohio (EUA) em 1931 e entrei na Congregação das Irmãs de Notre Dame de Namur em 1948. Depois me tornei bacharel em História com concentração em Ciências e Pedagogia pela Universidade de Belmont na Califórnia (EUA) com Pós-Graduação no Curso de Sócio, Política e Econômico do Brasil no Instituto dos Padres Jesuítas-Ibrades (RJ) em 1974. Conheci o Brasil assim. Com minha experiência na área de ensino fui professora de crianças campesinas, filhos de famílias assalariadas migrantes do México de 1956 a 1966. Em agosto de 1966 cheguei ao Brasil com visto permanente que tenho até hoje com muita honra.


Como foi o casamento da sua história de vida com os movimentos sociais brasileiros?


Bem, fui para o Rio de Janeiro cursar Língua Portuguesa em 1966 e em dezembro deste mesmo ano vim para Coroatá/MA, a convite de Dom Mota, Arcebispo da Arquidiocese de São Luiz, onde fiquei até dezembro de 1973. Lá trabalhei com famílias sem-terra, na organização da Ação Católica Rural e Sindicatos de Trabalhadores Rurais. Trabalhei com jovens rurais através do Jovens Ação Católica e na organização de escola municipais no meio rural. Em janeiro de 1974, a convite de Dom Estevão, bispo da Diocese de Marabá vim para Abel Figueiredo (PA), mais precisamente para o Pará em 1970, onde fiquei até o final de 1977. Nesta localidade desenvolvi trabalhos com famílias de migrantes e posseiros através do Movimentos de Educação de Base (MEB) do Governo, organizei escolas primárias no meio rural. Fiz parte da criação da Comissão Pastoral da Terra no Pará em 1976, onde participo até hoje. Em junho de 77 vim para o povoado de Arraiá no Pará-150, hoje Jacundá e fiquei até abril de 1982, lá trabalhei com posseiros das terras da União na nova estrada. Todos orientados pela CPT que promovia a cada ano, um curso de formação de duração de dez dias em Abaetetuba/PA, onde eram discutidos e estudadas as leis que governam o uso da terra , cursos esses, orientados por sociólogos, teólogos e economistas.


Fale um pouco sobre a sua paixão pela Amazônia, a vida na Rodovia Transamazônica.


Em novembro de 1982, a convite de Dom Erwin Krautler, bispo da Prelazia do Xingu passei a ser membro da equipe da pastoral, iniciando meus trabalhos na Transamazônica, fixei residência no Centro de Formação Nazaré, Km 95 da Transa-Leste na Área Pastoral entre o rio Anapu e Balsa no Belo Monte. Sua colonização se deu de forma diferenciada dos demais municípios da região, sendo loteada pelo Incra até no máximo até no máximo 2km da Rodovia, o resto do território foi dividido em lotes de 500ha, 1000ha e 3.000ha, formando as glebas Bacaja do lado sul da Rodovia e Belo Monte do lado norte. Parte destes lotes foram licitados e alienados na década de 70 para pessoas do Sul e Sudeste do país, quando o governo federal tinha uma grande campanha de ocupação da Amazônia. Por outro lado, poucos destes licitantes vieram para a região e cumpriram seus contratos com o Órgão licitador. Paralelo a isto, as pessoas foram chegando, entrando de mata adentro, abrindo picadas e se apossando das terras de forma espontânea, onde é comum encontrar até hoje, famílias que moram há mais de 20 anos na terra, que por sua vez está licitada e alienada em nome de pessoas que nunca vieram na região. Problemáticas que o Incra ao longo dos anos ainda não conseguiu resolver. Meu primeiro trabalho foi investir na educação criando cursos de formação de professores (1º e 2º graus), trabalhei com a construção das escolas pólos das seguintes localidades: Vila Nazaré, Vila Anapu Km 130, Vila Sucupira, Vila Nova Canaã e Centro Nazaré, através de convênios com o Incra; iniciei a organização dos trabalhadores em associativismo, criando em janeiro de 1986, a Associação Pioneira Agrícola da Transa-Leste (Aspat) - primeira associação de trabalhadores rurais da Transamazônica e participei do grande trabalho para a emancipação política da Vila de Anapu, culminando com plebiscito de 3 de dezembro de 1995 e sancionado e publicada a Lei em 27 de dezembro do mesmo ano.


E quanto aos conflitos em Anapu? Como nasceu o Movimento de Mulheres Lutadoras em Anapu? Quais os projetos realizados?


Bom, com a emancipação da Vila Anapu continuei na luta para que projetos fossem realizados e trabalhei pela organização dos trabalhadores em grupos para a elaboração de projetos, implantando sete grupos com máquina de beneficiar arroz, quebrar milho transformando-o em fubá, criamos a revenda central e oito revendinhas com as mulheres trabalhadoras rurais, no intuito de ajudar os esposos com os produtos de primeiras necessidades, daí nasceu o Movimento de Mulheres Lutadoras de Anapu. Um incentivo para o homem se firmar na terra, tudo isto com o apoio de minha Congregação da Prelazia do Xingu e da CPT nos anos de 1993 e 1995. Buscamos através de outros projetos a garantia da sustentabilidade de nossas organizações, aí então foi elaborado o Projeto Demonstrativo tipo A-PD/A, que foi aprovado e finaciado pelo PPG7. E com o movimento mais organizado demos um passo a frente , buscando a criação e implantação da Mini-Indústria de Frutas, apoiado pelo Ministério do Meio Ambiente , através da Secretaria da Amazônia , criando também a Associação Ecológica e Solidária de Frutas da Amazônia. Junto com os movimentos sociais de Anapu, venho desde 1997 solicitando ao Incra a criação de Projetos de Assentamentos adequados para a conservação da Amazônia, como é o caso dos PDS’s. A estes projetos tenho dedicado todo o meu tempo e energia, mesmo aos 72 anos de idade, pois viso evitar os conflitos fundiários e dá terra para os homens e mulheres que queiram tirar seus sustentos e conservar a natureza, pois aqui a grilagem e o comércio de terras públicas são comuns e para tanto , a presença de jagunços armados.


A senhora tem sofrido ameaças de morte por incentivar outras pessoas na luta pela terra combatendo o latifúndio?


Sim. Ameaça de morte não só a mim, mas também as outras lideranças e a expulsão de posseiros das terras são freqüentes, conforme foi constatado pelo desembargador Gercino José da Silva, Ouvidor Agrário Nacional, na audiência pública, realizada no dia 26 de setembro de 2003 , em Anapu. Hoje sou ameaçada de morte, publicamente, por fazendeiros e grileiros de terras públicas, como foi visto por todos que presenciaram a Conferência Popular realizada em Altamira, onde estava presente também o ministro do Desenvolvimento Agrário e tantas outras autoridades. Mesmo assim, tiveram a ousadia de ameaçar-me e pedir a minha expulsão de Anapu, tudo isto só porque clamo por justiça. Agradeço a Deus estes anos riquíssimos de aprendizagem, amizade com o povo e apaixonada sou pela sinceridade, partilha, hospitalidade, resistência, firmeza e disponibilidade. Só peço a Deus a Sua graça para continuar nesta caminhada, lutando para que o povo tenha sempre uma vida mais igualitária e que nós aprendamos a respeitar a criação de Deus.

Mulheres como a irmã Dorothy que a própria vida é sinônimo de luta e dedicação pela causa dos mais fracos e injustiçados da sociedade, merecem ser lembradas e exige de nós indignação pela impunidade que se fazem com outras Dorothys e Pedros que morreram no Brasil e ainda estão no anonimato.... mas deixaram sementes de vida para quê outras vítimas de abusos no campo sejam guerreiras e lutem por seus direitos....

terça-feira, fevereiro 07, 2006

A arte de conviver com os contrários

Quem não sabe ser malabarista na arte de viver, não vive, apenas é pisado pelas duras vidas que atravessam sua vida. É necessário, saber conviver com os contrários, com àqueles que não têm sensibilidade, por talvez terem passado na vida por momentos duros e não tiveram uma cura interior, nunca souberam perdoar e caminham na vida como espectros, duros sem coração.


Há uma frase célebre que diz os brutos também amam, com certeza amar é uma atitude em cada um, com cada ser acontece de uma forma. Amar universalmente, agapemente de corpo,mente e espírito é uma arte mais difícil. Temos que nos deixar ser lapidados pela luz divina, sempre há aquele escuro quarto em nosso ser, onde ninguém entra, estão lá as mágoas, os complexos, as rejeições acumuladas, as frustrações....é necessário abrir a porta e deixar o Mestre dos mestres agir. Ele é o divã perfeito, pois nos conhece por dentro e por fora, é onisciente. Deparei-me com pessoas amigas estes dias, amáveis e calmas aparentemente, mas com o passar dos anos as traições de seus maridos ou pretensos amados invadiram suas almas e deixaram feridas que nunca foram curadas ou expostas. Eu dizia esta mulher é sábia, não fala, não expõe sua situação, só que àquelas decepções se tornaram um cancer. Quantas pessoas estão amargas pela vida porque não souberam perdoar e transformar suas dores em alegrias com a uncção de Deus.


José do Egito, personagem bíblico, tinha tudo pra não perdoar seus irmãos que o venderam por 20 moedas de prata. Ele inocentemente contou um sonho para seus irmãos, que eles se prostariam diante dele e o sol e as estrelas também. Este enigma foi desvendado, quando José se tornou governador do Egito, exaltado por Faraó que teve um sonho e só ele o interpretou. José passou 13 anos na cadeia por ser injustamente acusado pela mulher de Potifar de tentar estuprá-la. A Bíblia conta que ela o tentou assediar, como ele se negou a trair seu Deus e seu chefe, ela o denunciou, perversamente. Mesmo assim, ultrajado e humilhado, ele não deixava de fazer tudo com eficiência e amor, sendo o melhor na mínima posição que o mundo o colocara como na prisão, até que veio a exaltação.


Muitos de nós , somos ansiosos , queremos as coisas pra ontem, as relações emocionais se fazem em um dia e se acabam em dias também , ou meses. Não há compromisso com o corpo do outro ou com a alma , não há amor de verdade, só satisfação do momento em alguns casos, tudo porque não queremos esperar o momento de Deus e a pessoa certa para nossas vidas. Daí surgem filhos destas relações sem estrutura e mágoas profundas, comprometendo sua vida espiritual para todo o sempre. É vital para quem quer viver um grande amor, a espera pela hora de Deus e o compromisso com o amor verdadeiro, não vale apena viver a pressa das paixões e magoar as pessoas. A arte de amar exige de nós, poesia e prosa, sensibilidade e muita habilidade para lidar com espinhos e rosas.

Tânia Rocha (Para o livro o Doce-Amargo)